quarta-feira, 31 de dezembro de 2008


Havia um velho, muito pobre numa vila, mas mesmo os reis tinham inveja dele, porque ele possuía um belíssimo cavalo branco. Um cavalo como esse jamais havia sido visto antes – tal a beleza, a grandiosidade, a força. Os reis queriam o cavalo e ofereciam preços fabulosos, mas o velho dizia: “Este cavalo não é um cavalo para mim, é uma pessoa e como posso vender um amigo? Não, não é possível”. O homem era pobre, a tentação era grande, mas ele nunca vendia o cavalo.

Certa manhã, ele verificou de repente que o cavalo não estava no estábulo. Toda vila se reuniu e disse: “Seu velho tolo, nós já adivinhávamos que algum dia o cavalo iria ser roubado. E você é tão pobre – como pode proteger tal preciosidade? Teria sido melhor vende-lo. Você poderia ter conseguido qualquer preço que pedisse, qualquer preço louco teria sido possível. Agora o cavalo se foi. É uma maldição, um azar”.

O velho disse: “Não vão tão longe – digam simplesmente que o cavalo não está no estábulo. Este é o fato; todo o resto é julgamento. Se é um azar ou não, como podem saber? Como podem julgar?”.

O povo contestou: “Não tente nos fazer de bobos. Podemos não ser grandes filósofos, mas nenhuma filosofia é necessária. É o simples fato de que um tesouro foi perdido e é um azar”.

O velho disse: “Eu me prendo ao fato de que o estábulo está vazio e que o cavalo se foi. Todo o resto eu não sei – se é azar ou uma benção – porque isto é apenas um fragmento. Quem sabe o que vem depois?”.

O povo riu. Eles pensaram que o velho tinha ficado louco. Eles sempre souberam que ele era um pouco doido; se não fosse, teria vendido esse cavalo e vivido com fartura. Mas ele vivia como um lenhador, estava muito velho, ainda cortando lenha, trazendo madeira da floresta, vendendo-a. Vivia da mão para a boca, na miséria e na pobreza. Agora, estava mesmo comprovado que este homem era louco.

Depois de quinze dias, subitamente numa noite o cavalo voltou. Ele não havia sido roubado, mas fugido para a floresta. E não só havia voltado como trazido com ele uma dúzia de cavalos selvagens. Novamente o povo se reuniu e disse: “Velho, você estava certo e nós errados. Não foi um azar, ficou provado ter sido uma benção. Pedimos desculpas pela nossa insistência”.

O velho respondeu: “Mais uma vez vocês estão indo longe demais. Digam apenas que o cavalo voltou e digam que doze cavalos vieram com ele – mas não julguem. Quem sabe se isto é uma benção ou não? Trata-se apenas de um fragmento. A menos que vocês saibam toda a estória, como podem julgar? Vocês lêem uma página de um livro, como podem julgar o livro todo? Vocês lêem uma frase numa página – como podem julgar a página inteira? Vocês lêem uma única palavra em uma frase – como podem julgar a frase toda? E mesmo uma só palavra não é tudo – a vida é tão vasta -, um fragmento de uma palavra e vocês julgaram o todo! Não digam que isto é uma benção, ninguém sabe. E estou feliz no meu não-julgamento; não me perturbem”.

Desta vez o povo não pôde falar muito; talvez o homem estivesse certo outra vez. Por isso ficaram quietos, mas, no fundo, sabiam muito bem que ele estava errado. Doze cavalos lindos tinham vindo com o cavalo. Com um pouco de adestramento, poderiam ser todos vendidos e renderiam muito dinheiro.

O velho tinha um filho jovem, um único filho. O jovem começou a adestrar os cavalos selvagens; uma semana depois, ele caiu de um dos cavalos selvagens e quebrou as pernas. O povo se reuniu de novo – povo é povo em todo lugar, assim como você é você onde estiver – e julgaram outra vez. O julgamento vem tão depressa!

Eles disseram: “Você estava certo, novamente provou que estava certo. Não era uma benção, era outra vez uma maldição. Seu único filho perdeu as pernas e, na sua velhice, ele era seu único apoio, Agora você está mais pobre do que nunca”.

O velho disse: “Você estão obcecados pelo julgamento. Não vão tão longe. Digam apenas que meu filho quebrou as pernas. Quem sabe se é uma maldição ou uma benção? – ninguém sabe. Novamente um fragmento e nada mais lhes é dado. A vida vem em fragmentos, e o julgamento é sobre o total”.

Aconteceu que depois de algumas semanas, o país entrou em guerra com um país vizinho, e todos os jovens da vila foram forçados a se engajar no exército. Apenas o filho do velho foi dispensado, porque estava aleijado. O povo se reuniu, gritando e chorando, porque de todas as casas os jovens tinham sido tirados à força. E não havia possibilidade deles voltarem, pois o país que havia atacado era um país grande e a luta era perdida. Eles não iriam voltar.

Toda a vila estava gritando e chorando; vieram até o velho e disseram: “Você estava certo, velho! Deus sabe, você estava certo - isto provou ser uma benção. Seu filho pode estar aleijado, mas ainda está com você. Nossos filhos se foram para sempre. Pelo menos ele está vivo e com você, e aos poucos ele vai começar a andar. Talvez ainda fique um pouco manco, mas estará bem”.


O velho disse outra vez: “É impossível falar com vocês, vocês continuam sempre e sempre – vocês continuam julgando. Ninguém sabe. Digam apenas isto: que seus filhos foram obrigados a entrar no exército, no serviço militar, e meu filho não foi obrigado. Mas ninguém sabe se é uma benção ou um azar. Ninguém jamais será capaz de saber. Só Deus sabe”.

Do livro "Antes que você morra", por Osho

Um comentário:

Anônimo disse...

Sim sim, e acredito ser normal do ser humano fazer e pensar nas coisas antes de analisa-las antes...tcs....só meus pesames...ahh Feliz 2009, q eu veja mts posts por aki no ano q vem