segunda-feira, 21 de julho de 2014








Diabo no Couro – Parte 6

Depois de horas sexo e descanso intercalando-se continuadamente os dois voltaram a conversar. Falavam futilidades sobre a cidade e a vida particular de cada um. Geanderson queria prestar atenção na conversa e, secretamente, gostaria de chamar a mulher ao seu lado de namorada, mas era um pensamento secundário quando foi ela mesma quem lhe explicou que estava endemoninhado.

Não exatamente, ao menos. Entendia que o familiar estava quase sempre por perto, que ele mesmo lhe convidara e que este não o possuía sempre, mas só quando este se deixava levar pelos pensamentos negros que, sabia, sempre estiveram no íntimo. Nunca se preocupara muito com o destino de sua alma, mas sempre procurou ser bom por temer uma hipertrofia de seu lado negro.

Agora havia uma lembrança incessante de que havia algo além do que a gelatina de seus olhos podiam ver.

Sabia também que era melhor aprender a conviver com o lado negro e com o demônio. Não era o tipo de cara que iria se arrepender verdadeiramente de porra nenhuma.

Continuava com uma vontade terrível de sair, mas não o faria até o Sol se pôr. A claridade continuava lhe incomodando e agora havia algo nos seus olhos que pinicavam muito. Só não mexia neles porque não queria uma inflamação para se preocupar. Além disso, tinha uma mulher maravilhosa ao seu lado para passar o resto do dia. Ela não parecia inclinada a sair e ele estava mais do que feliz com isso.

As horas passaram.

Conforme o quarto escurecia, uma tensão ia se abatendo sobre Geanderson. Não era o medo do escuro, mas o medo das coisas abissais que sabia existirem lá, agora. Nunca mais teria paz? Como é que iria se conformar com tais abominações sempre por perto? Era um cara comum, a despeito da aparência, e gostava disso. Só saber o que havia no escuro – o que sempre esteve no escuro e que nós nunca pensamos ser verdade – já o enchia de temor.

- Tens de resolver isso com ela – lhe disse sua convidada, como se lhe adivinhasse os pensamentos. – Tens de ir à um lugar escuro, pode ser aqui mesmo, esperar que ela apareça sem medo e tentar conversar calmamente. Veja a beleza da situação. Veja que você tem uma oportunidade que os outros não têm.

- Isso é uma maldição, isso sim! Oportunidade é o caralho!

- Tudo tem um lado bom e um lado ruim. Nada é de todo mal. - Ela se aproximou até colar o corpo firme no dele – Não teria me conhecido se não fosse por ela meine Liebe, e também tens sorte de eu não ser ciumenta. Na verdade, estou curtindo muito ter sexo com um demônio. Você é um bônus. Sua vida vai ser muito mais intensa, então porque se segurar?

- Porque há um monstro atrás de mim! – gritou Geanderson - Você pode gostar disso por ser dessa tribo de vampiros, mas eu não! Gosto de modificação corporal mas trabalho em escritório, sou um cara normal!

- Você acha que sou vampira por causa dos dentes? – disse sem perder o savoir-faire – Você me ofende, mas é um erro comum... – disse isso e segurou o rosto dele entre as mãos, olhando-o sempre nos olhos. – Sou um tipo diferente de monstro!

Algo mudou. De dentro dos olhos dela uma espécie de energia, uma sensação, saltou para dentro dos olhos do homem. Ele não estava preparado pra isso. Era como se um grande predador se materializasse à centímetros de seu rosto. Ainda era a mesma mulher ou outra coisa? Um medo terrível comprimia seu coração e sentiu mesmo sua alma se encolher como um animal acuado dentro do seu tórax. Pânico se instalou e ele recuou horrorizado, livrando-se das mãos em sua cabeça e andando – quase correndo – de costas. A mulher se levantou com uma expressão inominável na face. A transformação da beleza jovial para a encarnação da crueldade na forma de olhos frios e rosto lívido foi incrivelmente impactante e ele tropeçou e caiu de costas. A mulher andava na cama em sua direção, ereta e nua, e Geanderson fez grande esforço para desviar do olhar atroz. Obteve êxito quando olhou involuntariamente para seus pés tentando ver no que tropeçara e aí viu algo hediondo...

...um longo braço negro lhe segurava o tornozelo, com o dono dele oculto por sombras impenetráveis debaixo de sua cama.

Olhou de volta pra mulher e percebeu que o efeito de seu olhar havia se dissipado. Ela estava com medo. Olhou de novo para baixo da cama e percebeu olhos pequenos e brancos cravados nos seus, esperando. Ele olhou de volta para a mulher que começava a recuar, enquanto sentia um calor em sua face como se o Sol dos trópicos o banhasse. Sua visão periférica escureceu e só enxergava sua presa, que estava claramente em pânico. Ouviu um som gorgolejante e alienígena enquanto avançava com intenção de matar...

...daí percebeu que o som saía do fundo de sua garganta.

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