quarta-feira, 3 de junho de 2009



Este é mais um texto que eu escrevi quando eu tinha trinta anos e foi publicado no antigo Sucupiras, além de outros sites, como este. Mais uma vez: está com erros e o estilo é meio frouxo, mas eu procurei manter do jeito que estava.



Na porção nordeste do mundo, há alguns milênios atrás, havia uma tribo bárbara e nômade pertencente à antiga raça dos anões. Esta tribo referia-se a si mesma como Strödia-klan, que significa povo-javali, pois se julgavam similares em muitos aspectos a essa criatura. A região ocupada por esses nômades ainda hoje é chamada por outros povos de Bravária, mas tais anões a chamam de Strödiak, nome de um javali local.


Devido às constantes andanças, as pernas daqueles anões se tornaram ligeiramente mais longas que as dos outros de sua raça, que passaram mais tempo sob as montanhas. Isso fez com que fossem para sempre vistos com desconfiança pelos demais, mas que também os levou a se tornarem os mais adaptáveis, socialmente falando, dos anões que povoam nosso mundo. Essa facilidade em lidar com as outras raças fez com que se tornassem bárbaros mais cultos e bem informados que a maioria, os mostrou o que é a cerveja, que seria uma das paixões daquele povo e plantou as sementes o os retiraria de vez da barbárie, rumo à civilização.


Seus corpos não eram projetados para as longas caminhadas e eles colonizaram muito lentamente sua região, finalmente se estabelecendo próximo à uma grande montanha, parcialmente coberta por uma floresta de coníferas. De lá, a atração natural dos anões pelas pedras os levou a penetrar cada vez mais profundamente naquela que passaram a chamar de Strödia-klan-dûr. Lar-dos-Bravos-do-Povo-Javali, em uma tradução aproximada.


Esse povo se identificava com os javalis por diversos motivos. Os cabelos dos strödia-klan possuíam tonalidades que iam do ruivo ao loiro, na maioria. Eram onívoros com predileção por tubérculos, frutas e verduras. Possuíam estrutura familiar e lutavam em conjunto muito bem, mas igualmente não podiam ser derrubados com facilidade quando sozinhos. Não eram predadores, mas não eram presas fáceis. Se necessário, sua fúria subiria às estrelas. Eram baixos, mas fortes. Suas armas eram pequenas, mas mortíferas. Eram vigorosos, inteligentes e capazes, exatamente como os javalis de sua terra.


Os rituais que envolviam javalis terminavam com um jantar aonde o prato principal era esse animal. Ainda assim os strödia-klan não usavam partes do javali como adorno, ou mesmo a sua pele como roupa ou tambor, pois este é considerado nobre. Os strödia-klan agradeciam ao espírito-javali por manter a unidade da tribo e por partilhar de sua força com eles. Esta festa é chamada wil’dboar. Porco selvagem na língua comum.


Acontece que com o passar dos séculos o ritual simples e bárbaro foi se refinando e a cerveja que era servida junto com o javali assado deveria ser cada vez melhor. Quando passaram a residir na Strödia-klan-dûr e a cultivar plantas para sua subsistência começaram a produzir sua própria cerveja. Como a cerveja deveria ser digna do espírito-javali, eles jamais deixavam de trabalhar no sentido de melhorá-la, deixando a sua cerveja cada vez mais próxima do que se poderia considerar a perfeição. Mais séculos se passaram e era sabido que a cerveja era apreciada por muitas famílias, mesmo fora da festa anual em homenagem ao javali, os mestres cervejeiros se multiplicavam e caiu de vez por terra o tabu de se beber cerveja apenas em ocasiões especiais. Já civilizados, os strödia-klan passaram inclusive a subsistir do comércio da sua cerveja, a Brava, que por ser feita com variedades especiais de lúpulo e cevada e ainda contar com acondicionamento especial na montanha, naturalmente úmida e escura possuía um sabor único.


Mas um fato interessante aconteceu quando de sua chegada à montanha que chamariam de lar. Sozinho e muito velho estava um anão de longas barbas brancas e com conhecimento suficiente para preencher vários livros. Esse indivíduo pertencia a um clã de anões fora completamente exterminado pelos elfos, que partiram após alguns séculos de lutas contra esses anões. O sobrevivente que lá estava ensinou muito aos strödia-klan sobre engenharia, agricultura ao estilo da sua gente, a mecânica das bestas e que deviam ter ódio daqueles que destruíram uma nação sem nem ao menos preservarem seu conhecimento ou sua história. O último destes senhores anões era Stut’Yaku, mas os colonos confundiram com Strödiak e o adotaram como seu primeiro sábio por isso. Hoje ele é lembrado como Strödiak, O Que Já Estava Lá.


Certa vez os elfos assassinos voltaram àquelas paragens e descobriram que esta estava repleta de anões. Mas não estavam preparados para a guerra e foram cercados em um vale e lá exterminados ao longo de algumas gerações de anões. A guerra ensinou muito aos strödia-klan, que haviam perdido aquela selvageria antiga, que conheciam armas modernas, mas que não possuíam a prática necessária para destruir um inimigo acossado rapidamente. Muitos pereceram antes que fossem refinadas as técnicas e morto o último dos elfos. Foi nessa época que, para compensar a superior habilidade élfica em arquearia que Rôm, o Caçador, criou a besta de repetição strödiak e Flip, o Ferreiro, aperfeiçoou o machado do clã.


Civilizando-se cada vez mais e com os principais inimigos destruídos, deixaram de ser guerreiros na maioria, dedicando-se à mineralogia, à engenharia, à forja de armas e armaduras em metal, à manufatura de machados e bestas de repetição, ao manejo florestal na montanha (para não destruir o lar dos javalis e nunca terem de buscar madeira muito longe) e também à extração, lapidação, avaliação e negociação de pedras preciosas, além da fabricação da cerveja Brava.


Recentemente surgiu um movimento fascista de limpeza étnica que purgou todos aqueles que não eram strödia-klan puros da Strödia-klan-dûr. Na verdade, não havia muitos mestiços, mas aqueles que não possuíam cabelos e olhos claros foram considerados inferiores e as pressões internas levaram esses a sair de seu lar, sem a necessidade de lutas. Se há uma coisa que jamais aconteceu foi um strödia-klan matar outro e a maioria prefere que continue assim.


Hoje, com suas mulheres e crianças à salvo, os strödia-klan aproveitam suas longas vidas ao máximo, sem esquecer o credo a Olumor, deus dos anões, ou tampouco a sua herança guerreira. Continuam prestando homenagem ao javali, mas sem idolatrá-lo, e começaram a se espalhar pelo mundo novamente, o que impossibilitou um censo que determinaria quantos desta raça notável existem.

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